Devem extrair-se duas consequências da inegável relevância das sociedades de rating no processo de fixação de preços e no funcionamento regular dos mercados financeiros: de um lado, não podemos ensaiar uma diabolização sistemática destas instituições; de outro lado, deve igualmente evitar-se uma atitude de complacência em relação aos seus erros.
O certo é que as sociedades de rating cometem erros – o que encontra comprovação na recente crise financeira e na excessiva benevolência, aí revelada, na avaliação do risco de muitos CDO´s. Os últimos downgrades que afectaram o Estado português e os bancos nacionais, ambos decididos no rescaldo de boas notícias (o cumprimento pontual das primeiras etapas do MoU e o resultado positivo dos testes de resistência), são, a este respeito, a ilustração mais recente – e não seguramente a última. A percepção dominante, aliás, é a de que as ratings competem entre si na rapidez dos downgrades como modo de anular a imagem de excessiva lentidão de decisões pretéritas. Este cenário – exponencialmente agravado pelo oligopólio do sector, confinado a três agências internacionais – favorece decisões precipitadas e potencialmente injustas.
A regulação das sociedades de rating foi objecto de uma revisão recente, através de um Regulamento da Comissão Europeia, que obrigou a um registo destas entidades. Não obstante, este quadro regulatório é reconhecidamente insuficiente. Portugal tem sido bastante penalizado por estas omissões regulatórias. A par do défice de concorrência no sector, sobressaem dois problemas carecidos de solução regulatória: excesso de confiança e perversidade dos incentivos.
O problema do excesso de confiança resolve-se através de uma menor ligação entre notações e os comportamentos impostos aos agentes económicos – por exemplo, obrigando a uma rotação periódica de agências (como sucede nos auditores) e criando critérios regulatórios paralelos, nomeadamente a cargo do Banco Central Europeu e do Comité de Basileia, quanto à elegibilidade de instrumentos financeiros para as carteiras de fundos de investimento ou para servirem de colateral.
Como vício adicional, as agências de rating são sujeitas a uma constelação perversa de incentivos, mercê da sua posição concorrencial; as previsões mais pessimistas tendem a servir, por si, de factores agravantes da situação de crédito, tal qual profecias auto-cumpridas. A resposta a este cenário deve envolver uma supervisão mais dura (nomeadamente por parte da recém-criada ESMA) e a eventual exposição a acções populares de responsabilidade civil (e não penal) suficientemente dissuasoras.
Por estes motivos, como gatekeepers dos mercados, as sociedades de ratings devem ser sujeitas a um escrutínio mais eficaz – seja da parte das autoridades de supervisão, seja da parte dos investidores (sobretudo ao evitar-se uma excessiva dependência das orientações das ratings nas decisões de investimento), seja – em caso de actuação comprovadamente ilícita – pelos tribunais.